A pandemia causada pelo COVID-19 inevitavelmente resultará em diversos impactos na economia mundial. Além de impor dificuldades aos trabalhadores informais, a diminuição da receita também obriga as empresas a reduzirem o quadro de funcionários. Com isso, o número de desempregados no mercado de trabalho deve sofrer um impacto significativo nos próximos meses.
Apesar dos estados do Sul do Brasil se destacarem pelo baixo índice de desemprego em relação ao resto do país, eles também devem sofrer os impactos negativos no mercado de trabalho, os quais já estão sendo sentidos pelas empresas. Segundo pesquisa do Sebrae/SC, estima-se que 148 mil trabalhadores já perderam seus empregos. Outra pesquisa, do BTG Pactual e da FSB Pesquisa, afirma que 11% dos brasileiros já perderam seus empregos e 69% cortaram gastos da família.
Risco de um trabalhador ficar desempregado em função da pandemia
Com o objetivo de avaliar quantos trabalhadores estão em situação de risco de perder o emprego no atual cenário e o possível aumento na taxa de desempregados, separamos os mais de 8,2 milhões de trabalhadores formais da Região Sul do Brasil em três grupos, de acordo com grau de risco a que estão sujeitos: alto, médio e baixo. Os dados são da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS).
A exposição ao risco de perder o emprego está associada ao tipo de atividade da empresa onde se trabalha. Por exemplo, quem trabalha em hotel está sujeito a um alto risco porque esse tipo de atividade tem sofrido grande impacto das medidas de contenção da pandemia. Já quem trabalha num supermercado tem pouco risco de perder o emprego por causa da pandemia, pois o varejo de alimentos é uma atividade básica necessária.
Assim, a separação dos grupos de atividade econômica e respectivos níveis de risco foi feita através da Classificação Nacional de Atividades (CNAE) do IBGE. Tomamos 283 tipos de atividade listadas pela CNAE e formamos três grupos de risco, agrupando da seguinte maneira:
Baixo risco: atividades essenciais à saúde, varejo de alimentos e serviços públicos e privados que podem exercer suas atividades via home office.
Médio risco: indústrias e serviços que continuam operando mas tem capacidade operacional reduzida.
Alto risco: atividades comerciais, industriais e serviços que estão com operações restritas pelo lockdown, tais como a construção, hotelaria e o comércio, de forma geral.
O perfil dos Grupos de Risco
Quase 4 milhões de trabalhadores (49%) compõem o grupo de menor risco de desligamento. A maior parte deles trabalha no setor público, em instituições de ensino, em empresas ligadas ao abastecimento de alimentos e nos serviços de saúde. Ao mesmo tempo em que são o maior grupo, os trabalhadores de baixo risco também têm os maiores salários, com uma média de R$ 3,3 mil de remuneração mensal.
Por outro lado, os trabalhadores que convivem com maior risco de desligamento são também aqueles de menor remuneração. O pessoal empregado em atividades com alto risco de desemprego corresponde a mais de 2,3 milhões e a média salarial do grupo é R$ 1,9 mil. Grande parte deles ocupam funções no comércio, na construção e em serviços ligados ao turismo.
Outra característica destes profissionais é que quase dois terços deles estão empregados em empresas de micro ou pequeno porte, justamente as empresas com maiores dificuldades financeiras.
Por fim, outros 1,8 milhão de trabalhadores formais atuam em segmentos de médio risco, ligados principalmente à indústria de transformação. Nesse caso, o impacto econômico pode ser minimizado por ações de férias coletivas e treinamento dos profissionais, mantendo nível mínimo de operação. Além disso, o risco atrelado a este segmento é minimizado pela presença de empresas de grande porte, que geralmente possuem melhores condições econômicas para lidar com situações de redução da produção.
Aumento na taxa de desemprego
No final de 2019, havia no Brasil 11,6 milhões de pessoas desocupadas, que representavam 11% da força de trabalho brasileira. Já na Região Sul do país, a taxa de desemprego observada é bem mais baixa.
Tomando-se os três estados conjuntamente, a taxa de desemprego observada em 2019 foi de 6.8%. Isso significa que mais de um milhão de pessoas estiveram procurando por uma ocupação formal no final do ano passado. O estado de Santa Catarina é a região com menor taxa de desemprego do país, com 5,3%.
O tempo de permanência das quarentenas é um fator determinante da possibilidade de ocorrência de demissões. Além disso, os desligamentos dependem significativamente das medidas de apoio que o governo deve oferecer. Ações de amparo aos trabalhadores devem ser realizadas juntamente com iniciativas de flexibilização dos contratos de trabalho, para que o ônus econômico do atual cenário não sobrecarregue as empresas.
Numa análise semelhante à nossa, o Banco Central americano publicou estimativas de até 50% de desligamentos nas ocupações de alto risco. Seguindo essa perspectiva, e considerando que o grupo de baixo risco não deve apresentar mudanças significativas de empregabilidade, foram definidos cenários de desligamentos para os demais casos.
No primeiro cenário, o mais otimista, consideramos uma taxa de desligamento de 5% nas atividades classificadas como médio risco e 10% de desligamento nas atividades de alto risco. Este caso altamente otimista quanto à resiliência da economia nesse contexto de pandemia e quarentenas. Tal resiliência dependeria de um efetivo apoio do governo às empresas e ações de paralisação coletiva para minimização dos efeitos das quarentena sobre o comércio.
Ainda que pouco provável, esse primeiro cenário já colocaria as taxas de desocupação de cada um dos estados da região Sul acima do maior valor já encontrado para cada uma das economias da região para o trimestre. Na série histórica do indicador, o pior desempenho do trimestre ocorreu em 2017, ainda sob efeito da recessão de 2015. Portanto, o cenário improvável e altamente otimista já posiciona o nível de desemprego acima dos registros históricos.
No caso catarinense, foi comentado acima uma pesquisa do SEBRAE que projetou 180 mil desligamentos como efeito econômico imediato da pandemia. Essa projeção se aproxima de um quadro de 20% de desligamento dos funcionários de alto risco e 10% dos trabalhadores de médio risco, que corresponde ao nosso cenário intermediário no quadro acima.
A projeção deste impacto para os demais estados resulta em um volume de desligamento de cerca de 650 mil trabalhadores, um aumento de 60% do número atual de desempregados no Sul.
Por último, no cenário mais pessimista, onde cerca de um terço dos trabalhadores dos setores de alto risco de desligamento efetivamente perdem seus empregos, juntamente com 15% de demissões nas atividades de médio risco, teríamos uma situação em que a taxa de desocupação praticamente dobra.
Nas três projeções, o estado catarinense é o mais afetado em termos de aumento da taxa de desemprego, justamente por estar vindo de um contexto em que apresentava a menor desocupação do Brasil. Isto também pode ser explicado por sua menor presença de cargos públicos e maior número de ocupações nas indústrias, que foram contabilizadas com médio risco de desligamentos.
Siga em casa o tempo que for necessário Ainda que os números de desemprego sejam alarmantes, o objetivo deste texto é fornecer informação. Sabemos que a economia inevitavelmente será impactada e um número enorme de pessoas terão perdas de renda e qualidade de vida, para dizer o mínimo.
Por outro lado, não se trata de escolher entre minimizar os custos econômicos ou custos em termos da saúde ou vida dos cidadãos. A pandemia, inevitavelmente, impõe ambos esses custos para consumidores, empresas e governos. Não há evidências científicas de que o efeito econômico das quarentenas seja mais agressivo à sociedade do que o efeito a pandemia quando não se adotam estratégias de quarentena.
Grande parte da amenização dos efeitos econômicos da pandemia cabe aos governos, que possui instrumentos fiscais de política para compensar temporariamente as perdas econômicas dos trabalhadores e empresas vulneráveis à recessão. Os governos dos países do hemisfério norte têm lançado mão de muitos instrumentos de política econômica para mitigar os impactos das quarentenas.
Equipe Técnica:
Patricia Bonini
Henrique Reichert
Carolina Custodio
Edilene Cavalcanti dos Anjos
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